Arrumou-se com um pouco de pressa, combinara às onze. A mão firme retocava o lápis na parte inferior dos olhos. A sombra clara destacava seu olhar escuro. Nos lábios, o vermelho atípico. Há muito se esquecera de como ficava bem com ele... O celular tocou em algum ponto do apartamento. Riu consigo ao pensar que nunca conseguiria deixá-lo em lugares de que se lembrasse e então foi procurá-lo. Mais alguns minutos, risos ao telefone, um pouco mais de perfume, uma última olhada ao espelho... Pronta.
No carro batidas agitadas pré-diziam a noite. E por causa do vidro meio aberto um vento gélido beijava-lhe a face. Deliciada com o gosto puro de liberdade cantarolava alegre a canção ressonante. Lá fora uma lua gorda e brilhante parecia gargalhar misteriosa como se pudesse prever a noite da bela moça.
Parou a menos de cem metros da boate. Tivera sorte, nem mesmo ela saberia explicar como conseguira aquela vaga. Afinal eram quase meia-noite e a fila fazia ciranda pelo quarteirão. Contudo não estava nem aí! Era uma linda noite, as estrelas pareciam holofotes e ainda sentia um vento tímido sobre a pele. Nem brincar de roda com toda aquela fila poderia arrancar-lhe o bom humor.
Já na festa o ambiente escuro e a música alta empurraram-lhe forte e sem tempo nem ao menos para respirar ao cume de toda a animação. Com um suspiro substancioso derramou o vento que lhe faltara ao entrar. Muita gente, conversas saltando aos ouvidos e um pouco de fumaça foram os ingredientes finais despejados à mistura fervente que compunha o ambiente. Um breve passeio pela pista e pode ver uma agitação louca de braços e gritos a sua espera. Pensou então que são nessas horas que cogitamos fingir que não é com a gente que estão mexendo. Mas por alguma razão louca ou por simples remorso, de lembrar que também era capaz de insanidades do tipo, foi ao encontro das garotas. Afinal a falação deu-lhe sede e em busca de uma bebida foi ao bar. De longe pode ver ombros largos e um jeito largado de encostar à bancada. Interessante.
“Não acredito!” – a frase surpresa da menina foi seguida por um olhar de espanto do rapaz.
“Eu...aah...”
“M* não é? É T*, a gente estudou uuhn... o ensino médio todo juntos.”
“T? Nossa, quase não te reconheci! Você está tão... bem!” – a garota sorriu em resposta. – Faz...”
“Muito tempo. Eu sei.”
“É... isso. Mas como você tem passado? Morando por aqui?”
“Uhum, fim de faculdade, vida nova, apartamento novo, tudo, er... quase tudo, novo.” – os dois riram um pouco.
“Nossa, que inveja, quem dera eu estive terminando.”
“Ué, mas não?”
“Aaah, a faculdade sim né, agora têm mais três anos de residência daqui pra frente.”
“Olha só o outro reclamando de barriga cheia! Já vai estar ganhando rapaz, não ‘tá bom não?”
“Bem... bom bom bom...”
“Não ‘tá não.” – os dois riram recordando os velhos tempos. – “Sei, sei... Mas e aí, ‘tá com galera aqui?”
“To, to com um pessoal ali...”
“Pois é, é que eu também, e as meninas estão me esperando...” – o rapaz olhou pra baixo e depois pros lados distraidamente como se tentasse se agarrar a algo que os prendesse ali. – “Não quer juntar o pessoal não?” – o loiro voltou o olhar para ela.
“Claro.” – um sorriso discreto encheu o rosto dela. Fazia tanto tempo...
Quando finalmente todos foram reunidos, o que a princípio deixou as moças furiosas com o fim precipitado da noite das meninas pareceu a melhor ideia da noite após um pequeno intervalo.
“Aaaah, para! Eu amo essa música!” - As mangas soltas do vestido estampado dançavam acompanhando seu compasso leve e único. Ele sorriu, de verdade, como não fazia há muito tempo. Cara, como ela lhe fazia bem!
“T*, você... ‘tá muito linda.” – o rosto corado dela ganhou um tom a mais. Ela sorriu.
“Eu... eu não imaginei que você fosse ficar assim.”
“Assim?”
“É... Assim.” – Seu olhar brilhante e a boca exalando mistério não deixaram que ele contestasse mais uma vez.
“Eu não acredito que deixei você passar... Eu era um garoto realmente muito bobo.”
“Eu também não acredito que te deixei passar...” – Seus olhos viram-se como não faziam há muito tempo e a música já não importava mais. Seus corpos encontraram-se e o gosto doce da boca dele encontrou a sua. Ela não se lembrava de ter esquecido do mundo em mais nenhum beijo. Mas ela já não se lembrava mais... Eles se encaixavam perfeitamente, sincronizados, análogos sem nem precisarem de nada igual, aprazíveis. Ficaram ali, não se sabe, quem sabe até o tempo parou... Primeiro foi descoberta, depois bem... Foi intensidade. Uma intensidade que não se lembrava em nenhum momento antes, mas ela já não se lembrava mais... E no fim, bem, não teve fim. Foi só... Quando eles sorriram.
“Eu vou buscar uma bebida. Você quer?”
“Quero, aar...”
“Vodka com kiwi.”
“Você ainda lembra...” – Ele sorriu em resposta e virou. Agora as lembranças inundaram sua mente e pras costas dele ela se despediu. Correu. Fugiu. Saiu pela noite sem rumo ou direção. E a lua parecia gargalhar misteriosa como se quisesse dizer que tinha razão.
*de asas a sua imaginação ;)
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era pra ter ficado 1k de vezes menor, mas no fim... bem, textos são assim, quando ganham vida parece que suas pernas são capazes de correr por léguas sem se cansar. Fogem.