sábado, 17 de julho de 2010

Se Toca, Garota!

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"If you could save me,
From the ranks of the freaks,
Who suspect they could never love anyone." - Aimee Mann


Quer encontrar seu príncipe encantado? Então trate de encantá-lo. Porque só esperar e ficar reclamando, realmente, é muito fácil. Ninguém tem nada de graça assim não garota, e aposto que aquela sua amiga com o namorado perfeito e que vive babando por ela, lutou pelo que tem hoje. Além do mais, sem luta, não há valor. Por isso você não gosta daqueles fofos que diz querer amar.

Falar das dificuldades e mostrar como sua vida é difícil e digna de pena NÃO te ajuda em nada. Ficar se remoendo ou sendo pessimista não torna nada mais real. Pelo contrário, fica tudo mais difícil, mas longe do possível.

Textos tristes e melancólicos não são mais atraentes, e tristeza também NÃO traz mais inspiração. Eu diria que é muito mais comum estar indiferente a realidade – para a maioria de nós – ou mesmo triste do que sentir-se pulsar e ver tudo mais colorido. Por isso, quando acontece de estar muito feliz/apaixonado/louco ninguém se preocupa de ficar que nem um retardado procurando escrever algo bom ou aproveitável, afinal logo a felicidade vai-se embora e bem, ninguém quer lembrar-se de ter gastado esse tempo escrevendo ínfimos e tenros textos. Mas quando se está triste pode ocorrer uma ligação - muito complexa e de certa forma incompreensível pra mim – com a prolixidade ou a profundidade que levaria diretamente a escrita. O que não quer dizer necessariamente que ficamos mais inspirados quando tristes. Já que essa ligação mega estranha também pode ocorrer em outras ocasiões. O que geralmente não ocorre por falta de tentativas, quem sabe... Vai ver é só a vontade de desabafar mesmo, né?

Assim como ficar no ‘e se’ também não leva a absolutamente NADA. Se é ‘se’ é porque não foi, se não foi é porque não era pra ser, ou você não se esforçou o suficiente, ou alguém fez algo errado, ou ou ou... Não importa, o fato é que não aconteceu e ficar pensando como seria é uma idiotisse que só nos faz mais infelizes com todas essas probabilidades inexistentes. Não fique sonhando com o que você diria se estivesse lá de novo, o que tentaria se ele tivesse esperado mais um pouquinho, como seria se tivesse voltado atrás... Você NÃO fez isso. E sim, pode ter sido uma imensa burrice sua. Mas a não ser que tenha como mudar o que está feito, não tem mais motivo algum pra ficar remoendo. Como diria a Claire de Elizabethtwon : “Você tem cinco minutos para mergulhar na tristeza absoluta: aproveite, desfrute, descarte. E siga em frente.”

Há também de se parar de colocar a culpa nos outros, na sociedade, no mundo como está... Afinal, a sociedade é VOCÊ. Você faz parte do mundo assim como também das outras pessoas. Falar que a culpa é por prestar atenção demais ao que os outros dizem/pensam é querer se enganar. É você quem está deixando de levar em consideração sua própria opinião, empanturrando seus olhos e ouvidos com vozes alheias, belezas alheias. Com o que não é seu. Realmente importa o que os outros acham? Ou você não é forte o suficiente para crer em seu próprio julgamento?

Pela Primeira Vez

E ele me olhou, com olhos de quem vê pela primeira vez. Pude enxergar de novo o que já há muito não via mais: seus olhos quentes sobre mim, e meu sorriso que dançava pela boca.
Eu tinha sentido falta daquele rosto, dos dentes e do cheiro. Apesar do tempo, ainda me sentia no colegial. Afoguei-me de lembranças do que foi e do que poderia ter sido. E seus olhos distantes pareciam afogar-se comigo.

Foram alguns instantes em que voltei ao deserto de encantos e loucuras que ficaram pra trás. E por que ficaram pra trás? Já nem sabia quando, já nem sabia como... Já não havia pensamento que pudesse se organizar. Não me perguntava o que ele fazia ali, onde eu estava ou o que fora buscar. Meu corpo inteiro parecia concentrado em transbordar tudo aquilo que deixei que fosse. Tudo aquilo que nem sabia sentir mais.

- Oi. – foi só o que disse. Oi. Eu podia esperar qualquer coisa, mas oi? Contudo, logo em seguida, compreendi. Vi seus olhos desviarem-se, senti a sonoridade curta e tímida da pequena palavra e tudo o que ela poderia querer dizer.
Eu sorri.
- Oi. – foi só o que também saiu de minha boca, porém este não. Este foi mais lento, mais lânguido... Como se reproduzisse todo o silêncio de minha mente e o tempo triste que se fora. Fazia tanto tempo... Do que mais eu poderia me lembrar?
- Você ainda morde a boca quando pensa... – encarei-o intrigada. Seus olhos ainda eram tão doces quanto antes.
- É, eu, aah... Eu nem tinha reparado. – soltei a respiração forte e de uma só vez, também não notara que a andara prendendo.
- Haha, eu sei que não. – ele sorriu de lado, como fazia quando sabia que tinha razão. Talvez aquele fosse também seu sorriso de flerte. Não sei exatamente, ele nunca funcionara pra mim. Eu gostava muito mais... – Tão distraída como sempre. – olhei pra baixo e encarei meus pés que se cruzaram rapidamente.
- Novidade... – revirei os olhos. – Então, uuhn... O que anda fazendo por aqui? – ele me olhou com um pouco de espanto, o que não durou muito, pois pareceu lembrar-se de algo.
- Eu, aah, vim te ver. Não é óbvio?
- Rápido demais. – na-ná, ele ainda achava que conseguiria enganar a mim?
- ... Bem demais.
- Que?
- Nada.
- Ora! – cruzei meus braços em relutância. Puf...
- Haha, eu senti mesmo falta desta cara! – e então ele fez de novo, mais uma vez ele poderia me convencer de absolutamente tudo. Era o meu sorriso. Seus olhos viraram como quem está à espera de algo, que aparentemente não veio. Então continuou:
- Minha irmã está vendo uma proposta de emprego aqui, tranquei a faculdade, ‘tava pensando talvez em me mudar...
- Ah, eu aahn... Legal, sua irmã vai gostar daqui. Já não me vejo em outro lugar. Isso tudo parece parte de mim agora...
- Como um dia eu fui.
- Ahn? – suas palavras embaralharam-se em minha mente. Ele simplesmente não poderia ter dito o que achava que ele havia dito, poderia? – Doug, pra que isso agora? Por que só agora?
- Jane, eu não entendo, por que ‘tá falando assim comigo?
- Doug, eu que não ‘to entendendo! Eu fui embora há quase cinco anos! Sabe quantas vezes eu te vi esse tempo todo? Sabe quantas vezes eu vi seu número tocar? Ou quantas vezes eu pensei em voltar? - imaginei muitas vezes essa conversa, mas em nenhuma delas vi esse caminho, não acreditava no que eu mesma estava fazendo. Não, nem pra mim fazia sentido. – Você sabe quantas vezes cogitei abrir mão do meu maior sonho, Doug? Sabe?
- Não, eu não sei. – ele soltou uma respiração forte. – Eu só sei que atravessei mil quilômetros de estrada, deixei minha faculdade trancada, corri como um maluco pela cidade... Tem noção como é difícil encontrar seu número garota? Nem a Alice tinha isso mais!
- É lógico que não, ela quase não fala mais comigo desde que mudou pra Niterói, foi terminar o colegial lá, que seja... Você devia saber...
- Não é essa a questão, Jane! Que me importa a Alice? Que ela se exploda! Aliás, que essa cidade se exploda! Eu vim aqui na esperança de te ver outra vez! De novo...
- E a sua namorada?
- A gente não ‘tá mais junto.
- Por que trancou a faculdade?
- Eu não sei se é isso mesmo que eu quero.
- Então é isso? É esse o resumo? Você me aparece do nada, com sua vida fudida, querendo que eu a conserte mais uma vez?
- Você só pode estar brincando... Onde você aprendeu a falar assim? Eu falei que esses paulistas iam mudar a sua cabeça! Eu não devia...
- É, não devia mesmo! – a esta altura eu quase gritava, os sentidos borbulhavam por mim. – Você não devia muita coisa Doug! – tentava me acalmar, meu rosto fervia, devia estar vermelho. É, era como sempre acontecia... Há tanto tempo que já não acontecia... – Não devia muita coisa, mas bem, - soltei uma risada de escárnio – agora não faz muita diferença mais...
Ele abaixou a voz:
- Não faz? – aquilo parecia doer nele, tanto quanto nunca doeu em mim. Minha dor foi lenta, curtida, mas saboreada pouco a pouco. Não era como a dele, não, não, eu sofri tortura, ele talvez pena de morte. Mas ele não ia morrer mais, não mais.
Foi só um sussurro:
- Não mais... – e então eu vi a distancia, vi se aproximar devagar, com passos de quem não quer atrapalhar, com olhos de quem poderia devorar. Tão intensos quanto os dele; tão iguais na força, tão diferentes na razão... Tão mais meus.
Seus cabelos quase raspados e seu andar distraído eram tão diferentes do homem a minha frente quanto suas atitudes. Ele estivera comigo, a paciência fora dele, o tempo amargo também. Construímos aquelas pontes, elevamos montes, derramamos mar... Com o moreno havia sido diferente. Ele era o amor da sua vida. Fora forte, quase irresistível. Fora meu, mas fora pouco demais. Eram dama e cavalheiro sem assumir a dança. Nunca saímos do salão. Não, não, era mais forte do que poderíamos entender. Éramos jovens demais pra poder arriscar. Ou quem sabe um tanto tolos demais.
Sem querer eu sorri.

Ele acompanhou meu olhar, entendeu logo em seguida. Eu não poderia esconder, ele sempre entenderia sem que eu precisasse dizer. Seus olhos baixaram. Vi sua dor.
- Aham, eu já entendi. Eu... – ele perdeu as palavras. – só não faça na minha frente, ok?
- Ah... Doug... – Já sabia o que dizer, mas de repente ele só assumira seu lugar e falara tão igual ao loiro que quase me confundi. Eu quis fechar os olhos, quis voltar atrás. Quis o perfume de novo e o sorriso ao me ver outra vez. Quis todo o simples de antes. Quis, mais uma vez, ter feito tudo que deixei pra depois.
Mas ele chegara, passara a mão pela minha cintura e me apertara um pouco contra seus braços. Então me olhou nos olhos:
- Quer que eu saia? – foi quando vi. Ali, na minha frente. Era o que os diferenciava. Não eram os cabelos opostos, nem os olhos verdes: mais claro e mais escuro, não eram os ombros largos e fortes de Doug, nem seu bronzeado forte. Não era a pele clara de Tom, nem seu sorriso limpo. Não era a diferença em seus tons de voz, nem a força do abraço.
- Não, você pode ouvir. Foi ótimo te ver outra vez Doug, me liga se precisar de uma guia por algumas horas. Agora eu tenho que ir, tenho uuhn... Qualquer coisa com o meu namorado. – Era aquele brilho e a confiança que punha em mim. Ele sabia muito melhor do que eu mesma do que era capaz.

domingo, 4 de julho de 2010

Minha casa com você e o meu caso também

Talvez seja isso então. Ser adulto. Descobrir que seus sonhos serão quebrados e que você não vai trabalhar como quer. Você não vai salvar todas as crianças da África antes que gaste o melhor de sua disposição “salvando” rostos saudáveis. “É que eles precisavam de um reparo!”, é o que vão dizer. “O que precisava de um reparo era seu cérebro, seu duente!”, é, eu sei que vou pensar. Que bom para mim, pelo menos o cérebro de alguém tem que funcionar. Você também não vai salvar inocentes da apartação de tudo o que conhecem e tudo o que mais prezam. Não, não. Não antes de uns trinta anos trabalhando para impedir mais que a segregação, mais que a saudade dos filhos. Talvez pra garantir só alguns milhões a menos e alguns culpados que nem eram tão culpados assim. Talvez ninguém pense nos filhos quando pensa em tanto dinheiro. Talvez nem... Afinal, como se vende o amor?

Talvez depois de trinta anos você nem queira mais salvar ninguém, talvez aprenda a gostar de verde com toda a sujeira que vai ver. Talvez desentenda o que queria dizer quando tinha tempo pra pensar. Além do mais você não vai poder construir prédios chocantes, nem pontes que liguem cidades sem abastecimento. Nem construções enormes e muito coloridas, pra contrastar com as cores opacas das cidades. Não vai fazer um edifício pintado a letras de músicas do legião, nem uma chalana com um jardim-floresta no centro de São Paulo. Quem sabe alguns edifícios chatos e brancos que vão precisar sem repintados de dois em dois anos, com suítes e banheiras para todos os apartamentos. Além da enorme piscina e a vista pra praia, é claro. Talvez a praia se torne até particular. É, um dinheiro tão bem investido... Deve ser realmente louvável saber que foi o criador de tanta futilidade. E um viva aos lucros! Talvez você faça algumas entrevistas de que goste e muitas de hipócritas tão grandes quanto você. Talvez cuide de um zoológico inteiro. E então vai pensar: mas que ótimo! Pelo menos eu faço o que gosto e como gosto! Sim, lindo. Com animais presos. Realmente, louvável.

E vai parar, começar a pensar e procurar um sentido nisso tudo. Algum motivo pra continuar, algo que lhe dê forças. Talvez até pense em si matar. Ou mudar pro Hawaii e montar um restaurante. Às vezes em virar um naturalista ou um ativista no Tibet. E então se lembre de seus filhos, e de sua mulher. De como o sorriso dela pode fechar todo o quarteirão e parar o transito de uma cidade inteira. Ou ao menos o transito de sua cidade inteira. Vai lembrar deles correndo pelo jardim e pensar em como coisinhas tão lindas podem ter saído de você. Lembrar da mais nova gaguejando “papai”, e do mais velho aprendendo a jogar de verdade. A do meio com o skate no pé. O mais velho lhe vencendo na corrida. A do meio aprendendo a cantar. Da onde ela tirou aquela afinação? Ele nem devia saber cantar mais... A mais nova pedindo colo. O mais velho ajuda no dever de casa. Eles comendo pipoca na sala, e os olhos da mulher junto aos seus. Como fora que conseguira alguém tão perfeito assim? Por que mesmo ela lhe escolhera? Então vai pensar em como é sortudo. E em como foi ridículo pensar em si matar, ou em achar que tudo é ruim, que tudo é muito ruim, como todos parecem querer mostrar que é. E vai querer correr na praia de manhã e levar os filhos no parque, vai querer levar a família pra morar lá e depois rir da ideia. Quando fora mesmo que perdera a capacidade de rir assim de si mesmo? De querer o louco? De buscar aventuras? E vai pensar que talvez esteja ficando velho e de que devia levar a mulher ao Monte Santa Helena, como ela sempre quisera ir. Que deviam se mudar pro Hawaii e abrir aquele restaurante que sempre sonharam. Ou passar um ano velejando no projeto de sua esposa. E vai pensar na merda de trabalho que escolhera e como ele ocupava tempo demais de sua vida. De como era ruim trabalhar cinco dias pra viver só dois. De como não lhe valera de nada ganhar bem assim. De como seus maiores prazeres agora não vinham do dinheiro que tinha. E de que tudo o que lhe trazia sentido na vida nem em último lugar o trabalho tinha alguma relação. E vai querer saber da onde tirou a ideia estúpida de trabalhar com isso e não ser comentarista de esportes. E talvez perceba que o problema não era com as profissões, era com seus sonhos. E onde os guardara. De como gastara um tempo idiotamente grande se tornando tudo aquilo que sempre ridicularizava e ironizava. E chegue em casa e conte a sua mulher tudo o que queria fazer e de que essa vida não era tudo o que ele sonhara. Ainda. E ela lhe beije e diga que o ama e que um ano velejando era tudo o que ela precisava ouvir. E você se demita, ou tire férias pra começar a pensar em algo novo pra fazer. Ou começar a procurar nos classificados uma casa no Caribe. Talvez você também descubra que não é tão fácil assim, e talvez passe por dificuldades. Mas em meio à busca nunca mais pare pra pensar em se matar de novo. Porque apesar de todo fodido e sem dinheiro, você tem a mulher dos seus sonhos, filhos lindos pra criar e várias páginas em branco pra escrever. E que apesar de tudo estar uma bagunça com a sua mudança de casa, sua vida não poderia ser mais perfeita. E descubra que quando se faz o que se gosta, não importa como, as coisas simplesmente se acertam.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Dezenove

Abro os olhos, conto um a um: dezenove pela janela, eles sorriem. Canela, um pouquinho de avelã, tão meu, tão familiar que o peito até dói. Nada de lembranças, nada que me faça correr, apenas o gosto estranho de sono bem dormido. Minhas mãos apertam os lençóis. Mas logo me encolho e me estico, meus dedos tocam os olhos, meus dentes mordem os lábios, são eles que estão indo. Dezessete eu já tenho, mas quantos verei quando tiver dezenove? Talvez eu nem saiba mais contar... Vai ver serão os mesmos, mas mesmo assim eu não os veja. Talvez eles cantem, ou me gritem até enrouquecer... Quem sabe eu fique surda. Talvez entrem mais pelo vidro que irei ganhar ou vai ver eu os prenda em uma garrafa. Não, não, eles vão estar lá. Vão com suas cores, vão por minha sombra. Eles vão comigo. Talvez eles cresçam, ou quem sabe encolham, mas ainda assim, sempre estarão por perto. Além do mais, pela janela ela também me vê. E ela eu sei, nunca nem pode me deixar. Meus dentes me apertam de novo, não me lembro quando ele sorriu pela última vez com as palavras, mas elas estavam correndo outra vez. Ainda bem, eu também preciso delas.